Em 19 de maio de 1870 foi fundada em Campos dos Goytacazes a consagrada Filarmônica, intitulada LIRA DE APOLO. Esse grupo, apaixonado pela divina arte, devotos de Nossa Senhora Aparecida, tornou-se, tempos mais tarde, a popular e querida “Sociedade Musical Lira de Apolo”.
Numa tarde de sábado começamos uma prosa recheada de inquietantes informações com o maestro Ricardo Azevedo. Com seus quantiosos 69 anos, o atual regente da Lira de Apolo contou-nos de sua iniciante entrada no mundo da música, do qual o seu pai já fazia parte. Ricardo começou a trabalhar na Lira de Apolo aos 16 anos, em 19 de maio de 1955 escondido do pai, que era componente da banda adversária, a conhecida Lira Guarani.
O maestro Ricardo começou apenas como aluno, depois passou a ser o arquivista da banda. Na época o maestro Etieni Samari, vendo então o seu interesse, convidou-o a participar como integrante e foi quando Ricardo pôde contemplar muitos dos momentos em que a banda esteve no auge.
Com vários títulos, a banda é hoje a segunda mais antiga do País e a mais antiga de Campos, ainda em atividade. Sempre solicitada a abrilhantar festas, também fez parte da história do Brasil, recebendo com seus instrumentos de sopro, ilustres celebridades em importantes datas. Como em 1875 quando D. Pedro II e a Família Imperial visitaram a cidade para a inauguração da Estação de Campos na estrada de ferro de Carangola. Dentre outros marcos, a Lira tocou também na campanha presidencial de Getúlio Vargas, em 1950, na Inauguração do prédio dos correios, para o presidente Juscelino Kubitschek no Rio e na chegada do presidente João Goulart.
Ricardo disse, ainda, que a banda teve três sedes emprestadas antes de construir o próprio prédio e uma delas era na antiga Rua da Constituição, número 37, atual Avenida Alberto Torres.
Fachada da Lira de Apolo
Anos mais tarde a banda comprou um terreno com a ajuda de alguns integrantes e construiu sua sede, em 1912. As mãos que encantavam com harmônicas trilhas sonoras, não se opuseram, dia após dia no calor escaldante, a levantar o alicerce de sua casa.
A expressão de sua face ficara muda, ao relembrar do ano de 1990, quando a sede da sociedade Lira de Apolo foi consumida por um avassalador incêndio, que supostamente teria sido causado por um curto circuito, quando a direção da banda havia emprestado o prédio para uma festa que deixou em cinzas todo o lugar. Ficando seus músicos e aprendizes a mercê do destino. Por sorte não havia ninguém no local. E, posteriormente, o próprio maestro, mais uma vez, mostrou seu carinho pela história e luta quando, com a ajuda de apenas alguns garis conhecidos do mesmo, limpou o prédio das cinzas e escombros causados pela tragédia, para que todos pudessem voltar a entrar no local.
A Prefeitura de Campos, então, emprestou o prédio situado na praça São Salvador, onde hoje é localizado o museu , para que a banda pudesse continuar os seus ensaios. Infelizmente hoje este espaço não está mais disponível e o grupo limita-se a reunir somente aos sábados pela manhã no Teatro de Bolso. Várias promessas foram feitas em relação à reforma do prédio da Lira, mas nenhuma foi de fato cumprida e a esperança continua.
A reforma da sede ficou avaliada em torno de R$ 1,2 milhão, porém a prefeitura não demonstrou nenhum interesse em reerguer o prédio e manter o projeto. Existe uma lei criada no antigo governo de José Sarney, lei Rouanet, que dá às empresas a oportunidade de redução de impostos, se as mesmas colaborarem/bancarem a manutenção de obras culturais, e é com uma infinita esperança que Ricardo e todo o grupo aguardam por uma resposta do IPHAN, uma empresa não governamental, que capta recursos com as empresas privadas para a execução das obras culturais. Toda a documentação necessária para que seja feita a reforma já está no IPHAN, que fará uma avaliação final da solicitação e permitirá a execução da obra com a autorização do NEPAC.
É lamentável que os governos não invistam mais na nossa cultura e que deixem desaparecer com o tempo grupos que relutaram por anos para não cair na zona do esquecimento, bandas centenárias como a Lira de Apolo que são um estandarte na luta da preservação da cultura e resgate da nossa história.
Que a chama que um dia destruiu sonhos de pessoas que fizeram dos obstáculos combustível para ir em frente, alimente a sociedade moderna de paixão a música, história e cultura, que hoje está desaparecendo aos poucos...
Lira de Apolo em chamas - 1990
3 comentários:
Ótimo artigo, muito bem redigido! Parabéns. Esse espiríto jovem, questionador e revolucionário deve ser seguido por outros acadêmicos.
Sua sensibilidade me sensibilizou...parabéns!
Como instrumentista venho agradecer a redação desse artigo, não sou integrante de nenhuma banda, mas como amante da música não poderia deixar de comentar. É incrível o descaso que os nossos "Governantes" têm com a cultura no município. É impressionante ver que se gasta milhões superfaturando shows no Farol de São Tomé quando a nossa cultura agoniza. Nessas horas eu me pergunto, onde estão os royalties que são pagos pela Petrobras? Eles não deveriam ser usados na cultura em nosso município? Infelizmente tenho que concordar quando me dizem que o Brasil é um País sem cultura e sem memória, falo no Brasil porque se numa das menores divisões da nação não se dá valor a cultura como no geral teremos essa valorização? Sem memória pois a cada eleição temos novamente as mesmas figuras prometendo mundos e fundos para cultura, lazer e esporte e não vemos nada ser feito por essas áreas. 1,2 Milhões, isso pra quem tem o volume de dinheiro como o que passa nas mãos de nossos "governantes" não é nada. A "nossa" prefeitura, digo nossa entre aspas porque na verdade é deles, não faz nada porque não quer. O nosso município deveria ser o melhor da nossa região, contudo o que vemos é nossa cultura morrer, os buracos nas ruas aumentarem e nossa população ficar embaixo d'água na primeira chuva.
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